o cantar do simba
sexta-feira, 31 de outubro de 2014
sexta-feira, 27 de julho de 2012
Hoje o meu regresso a África. À paisagem africana. Encosto-me melhor a estas palmeiras mesmo com os cocos a cairem-me em cima ( no meio do mato eram os macacos que gostavam de brincar à batatada! E atiravam com força e com gritinhos histéricos de malvadez...) Olhando o mar e o pôr-do
-sol único , no Índico... os caminhos poeirentos do mato as picadas as longas distâncias como na aventura das ará...bias onde nos metíamos com mil e tal kilómetros de lonjura para encurtar saudades. Daquela vez para visitarmos uma minha irmã e cunhado. Do Chinde a Nampula!!!! Com horas de "chova" quando nos surpreendia a chuva torrencial no caminho e o jeep se enterrava!...Todos nós chovávamos o carro com os auxiliares africanos e descaços quando os ténis os deixavam de ser... Mas chegávamos. Por vezes irreconhecíveis!
Venho de longe, irmã
Dar-te um abraço de perto
Afastei nuvens dispersas
trago-te paz de momento
no tormento das guerrilhas
Trago na voz do poeta
a imensidão das florestas,
o colorido africano
Trago-te sol dos caminhos
trago-te um país de música
no matiz do arco-iris
ao sol pôr
trago anjos em fila
com trombetas e clarins
tocando hinos de amor
Oiço a tua voz, irmã gemer de espanto
Espelho são teus olhos, lágrimas e pranto
bem triste foi a hora que chegou
Conheço o mapa, Irmã, conheço a história
(...)
Poesia longínqua nesta noite quente
poesia bem triste, débil como um fio
deixei-a na estrada, deitei-a ao rio
Aqui estou sem nada1Ver mais
terça-feira, 15 de maio de 2012
SER SÓ / ESTAR SÓ
Ser só é tão simplesmente, não ser de companhia. É ter perdido "alguém" com a certeza certa que nunca mais verá
Ser só é ser sem a... companhia de ontem na soma dos anos ser ausente dos desabafos mesmo que opostos com resolução acertada
Ser só é mais que isto....
É não sentir o olhar atento o gesto conciliador a palavra certa o carinho desejado o sonho apetecido a caber nesta realidade que se chama vida a dois!
Ser só ainda é mais que tudo isto!
...é sentir o abandono cultivado nas imagens colhidas num "ontem" qualquer
é apagar para sempre o clique de uma chave na fechadura da porta
é anular os passos apressados de encontros permanentes
Ser só é ainda mais que isto e mais do que tudo isto!!
...é o fecho da vida o abandono total nesse fervilhar profundo onde giram impacientes o grito das aves nas ramadas altas dos ciprestes e onde
tentam ainda ser nesse silêncio sepulcral e nessa solidão gratuita
Estar só é diferente! Eu não gosto de estar só Por isso, quando me desprendo do silêncio tudo se agita nas palavras que me dizem e gritam ordens na música que me enternece e consola nas vozes que me pertencem e envolvem com o seu entusiamo de vida de trabalho e das suas aspirações merecidas quando ausentes ou quando presentes
Só quando o "ser só" e o "estar só" se fundem na disposição irrequieta do meu eu, é que as sensações agradavelmente estranhas se escancaram com alguma nitidez nos olhos como se o ontem fosse hoje e o hoje fosse ontem... E é tal o emaranhado tecido no tempo que se torna difícil separar fio a fio para lhe dar a realidade desse espaço e desse tempo que tão facilmente através do mecanismo da memória, transporta
Depois tudo se quebra com a velocidade do pensar/ sentir como o vidro de uma janela aberta num dia de temporal... estilhaços que se espalham nessa bruma de tudo o que se foi e viveu em pleno
E para falar verdade começa é a cansar-me o "amanhã" que vai eclodindo nos milhares de passos apressados num adiar constante da existência da vida..."amanhã, logo se verá amanhã falaremos amanhã teremos mais tempo amanhã vamos finalmente, almoçar amanhã haverá mais coisas a dizer... Até amanhã!
E é quase neste adiar constante das pequenas e grandes coisas que a vida toma contornos de alguma angústia porque fica sempre no meio do caminho... que é esse hoje e que depressa se apaga
O ontem e o hoje, naquilo que entendemos por esse tempo, nunca mais se repetem
O amanhã será sempre mascarado de tudo isso com o gozo dor alegria sonho trabalho realidade pesadelo carícias inerentes ao pensamento e ao coração
E será sempre uma incerteza certa
Também a minha realidade é a irrealidade dos outros
A vida tem apenas a idade que tem
- Que pena não sermos como as árvores centenárias que morrem de pé e não sabem da eternidade!
domingo, 13 de maio de 2012
quarta-feira, 25 de abril de 2012
quarta-feira, 20 de abril de 2011
ÁFRICA sempre a durar nesta forma singular. Era o fascínio era a entrega era o colorido o exotismo era a vontade de Deus e dos Homens! Sem tabus ou preconceitos.
sábado, 29 de janeiro de 2011
O CANTAR DO SIMBA
ÁFRICA
PORQUÊ, O CANTAR DO SIMBA
Percorremos Moçambique de norte a sul. Desembarcámos em Lourenço Marques, cidade encanto que nos despertou África. Meses depois rumámos a Mocímboa da Praia com visitas a Mueda e Palma. Ano e meio regressámos a Portugal por motivos de saude. Um ano depois nova partida com outro sabor de África. Agora no sul do Save. Inharrime, com visitas a Inhambane e Lourenço Marques. Também quando nos íamos banhar no Índico na maravilhosa praia de Závora. Distâncias enormes que não se contavam nem pesavam. A Zambézia já nos acenava, três anos depois. O Chinde, a Sena Sugar... Os braços do Zambeze a tornar-nos prisioneiros daquele espaço mas sempre a ultrapassarmos as dificuldades das travessias do rio, por vezes revolto ou do matope, quando nos venturávamos por terra nas nossas idas a Quelimane. Mais tarde Vila Cabral onde o palco da guerra se juntava ao nosso viver que queríamos pacífico. A luta no Hospital ao lado da nossa grande casa e a ajuda sempre que possível para atenuar sofrimentos. Colaborava sempre que necessário e gostava de estar junto de quem cuidava de tantos doentes. Um ano mais passou e o destino que não pensávamos terminar tão abruptamente, estava a correr...Nampula, cumpriu-se durante o período de quatro anos! E o pano correu-se de forma inesperada! Regresso a Portugal. Definitivamente!
Porquê o cantar do simba? O nome deste meu blogue. Porque foi em Mocimboa da Praia, terra de leão, (simba) que me ficou marcado para todo o sempre na minha alma a pulsar com todos os sentidos, o seu cantar arrepiante em pleno dia e pela noite fora...E porque me ficou o seu cheiro o medo e o delírio doutras vozes a ecoar no espaço africano o cheiro da selva outros cantares que a noite trazia o cheiro da terra molhada a melodia das aves raras o bulir quase silencioso dos ramos o calor morno dos corpos e das águas o colorido africano as aventuras de algumas caçadas e toda a melodia como orquestra nos ouvidos... O CANTAR DO SIMBA e a água da cisterna que se bebia, (e a sentença ouvida: quem bebe água da cisterna, nunca mais quer sair de África, marcaram a minha vida primeira neste espaço desconhecido)...Lá, onde o sol se esconde... como ouvia dizer a muitas pessoas, em L.Marques. Uma espécie de consolação... para quem desconhecia por completo o segredo de África e o pulsar do seu coração! Depois toda a sua nostalgia triste e alegre me invadiu.
sexta-feira, 22 de outubro de 2010
domingo, 3 de outubro de 2010
QUE OUTONO É ESTE
são penas caídas
espalhadas no chão
são rostos da vida
que morrem em vão
despidas das árvores
sem folhas sem folhos
ficam na nudez
no pranto dos olhos
erguidos fantasmas
crepúsculo outonal
no rubro da espera
que atento seduz
ganha-se outra luz
tão só e mais triste
nas sombras em vão
perdidas na cor
espalhadas no chão...
são penas caídas
tolhidas no tempo
deste tempo, são
mágoas aquecidas
tão só acrescidas
no meu coração
isabelmonteiro
quinta-feira, 30 de setembro de 2010
segunda-feira, 6 de setembro de 2010
sábado, 26 de junho de 2010
TUDO SE PERDE AO LONGE ... JÁ NÃO HÁ MAIS NADA!
Tudo se perde ao longe
já não há mais nada.
Sentir é nada
se existir não pode
tanta rota ignorada
Tanto gesto inútil
nessa sombra do repouso vão
que por si se explica
ou talvez não
nada se explica
rigorosamente nada!
Voam as pombas
na imaginação
de um céu volátil
que se abate
quando a chuva cai
se tudo acaba tudo se vai
nada se detém
à sorte dura
Alcova térrea
onde tudo passa e esquece
da alma o refrigério...
ruas sem nome
dos números se é cativo
marmóreo branco
tecido numa só luz
ali mora a verdade na espera sempre em vão
Dormem ciprestes e roseirais sombrios
sussurra o vento, soltam-se os pardais
em lancinantes pios
serenata tardia melancólica e triste
estende-se a vida que o olhar consome
de nunca haver mais nada
prisioneira da inútil estaca
e de uma simples matemática:
nada a somar ou a subtrair
nada a multiplicar ou a dividir
Amálgama confusa do sentir...
quarta-feira, 2 de junho de 2010
sexta-feira, 14 de maio de 2010
aniversário 15/05
te verei chegar
de carro
e no teu olhar distraído
acendendo um cigarro
NUNCA MAIS
te verei chegar
da nossa janela
onde tudo
tinha um sentido
a qualquer hora
que chegasses
e me encontrasses
à espera
NUNCA MAIS
te verei chegar
quando absorta
na distância
ouvia a melodia
do teu assobio familiar
NUNCA MAIS
te verei chegar
paraste no centro
da minha vida
e todo o mundo
que irradiava
à nossa volta
parou
à nossa porta
estática
fico no silêncio
mordendo todo
o passado
que quero
como recordação
Oh!soubesse
eu saboreá-lo
no tempo
de agora
que me foge
e trai
porque nunca mais
te verei chegar!
sábado, 10 de abril de 2010
sexta-feira, 9 de abril de 2010
MOCIMBOA-(SIMBA), terra de leão.
E quando um dia em Lourenço Marquesnço Marques, onde permanecemos durante os primeiros seis meses , me perguntaram qual o nosso destino a seguir e lhes disse que era Mocimboa da Praia...lá para os confins do norte de Moçambique,distrito de Cabo Delgado, a surpresa da resposta era sempre a mesma!Alguns com conhecimento da terra e também à laia de conforto iam dizendo... Para onde a senhora vai e tão novinha. Aquilo é a Coreia do Norte ...vai para onde o sol se esconde...Olhe que até andam os leões a passear nas ruas e os leopardos espreitam as capoeiras e escuta-se, pela noite fora e com horror, o gargalhar das hienas (Kizumbas) e com as chuvadas, as tarântulas entram quase em procissão dentro das casas!!!! Com estas notícias,sentia-me cada vez mais aventureira mas ficava cada vez mais horrorizada! Mas não conseguia medir tais medos. Era a primeira vez que pisava terras de África! E sobretudo o mato africano. Não me mentiram.Ouvi algumas vezes o CANTAR DO SIMBA,leão, no rio Quinhevo que distanciava da nossa casa 5Km!Mas era como se ali estivesse muito perto de nós..."Ih senhora não vais ter medo, não, o simba está a cantar ali no rio Quinhevo". Não sei o que era para eles aquela distância! À noite,também nitidamente ,se ouvia o seu arfar. Só não vi foi os elefantes, mas observei as patas agigantadas desenhadas no chão das picadas, os imensos rastos,o seu cheiro intenso que na selva se espraiava e sentia pavor sempre que acompanhava meu marido, nas suas visitas sanitárias, às regiões de Mueda e de Palma que faziam parte da Circunscrição e Delegacia de Saude de Mocimboa da Praia.E a carrinha lá se ia aguentando pelos trilhos das picadas...Eram 80 Km de suplícios pois ambas as terras, distanciavam 80K. Uma para o interior,outra para o litoral.Escusado será dizer que na época das chuvas não se podia sair para lado nenhum. Somente de avião ou de barco.
E, porque foi este grito que me ficou e me marcou profundamente, o cantar do Simba,e porque tive a oportunidade de conhecer esta, e afinal, maravilhosa terra onde todos juntos, falo das outras famílias ,éramos uma família, incluindo muitos casais de cor,e porque fui feliz e me nasceu lá uma dos filhos , e porque eu soube tão bem abraçar estas e outras viagens das arábias com coragem e entusiamo, e porque tive o ensejo de conhecer os macondes,povo guerreiro e figuras muito peculiares com as suas tatuagens originais e que impunham algum medo e de lidar com as suas mulheres e crianças de forma muito própria,até se humanizarem e porque tudo tinha um encanto inefável, incluindo a sua natureza agreste, e também o centenário e enorme cajueiro que envolvia parte da grande casa que habitámos durante ano e meio, e onde os corvos iam mitigar sedes, bebendo o sumo do caju para tombarem, logo a seguir, tontos no chão...e porque a luz do gerador eléctrico da Administração fechava às 23 horas e ao terceiro sinal dado, tínhamos que acender os pétromax e recorrer também às velas ...E, por tudo isto e tanto por aquilo que juntos vivemos, adaptando-nos a todas as circunstâncias e porque enriquecemos tão exoticamente as nossas vidas e porque volvidos tantos anos, meu Deus, e hoje me sabe tão bem recordar...KANIMAMBO!KANIMANBO!!!!!!!!!!!
quinta-feira, 8 de abril de 2010
Falam lenços agitados
aos nossos olhos molhados
entre tanta comoção
lenços erguidos perdidos
trazem na sua mensagem
invernos de liberdade
ilusões esperanças mágoas
a este cais da saudade
cais deserto cais sombrio
frágeis tiras de papel
em estranho festival
nas velas soltas ao vento
murmúrio já vem do mar
num suspiro vertical
cerca o silêncio do tempo
segue o navio para o mar
em rasgos de liberdade...
distante longe do tempo
vislumbro ainda a partida
no cais da minha saudade.
segunda-feira, 5 de abril de 2010
Sou uma saudosista por natureza. Mas gosto de ser assim. Não me queixo e ninguém se aborrece. Falo comigo, olho os longes, viajo, olho os espaços, o mar o céu o sol a lua o dia e a madrugada choro rio atropelam-me as recordações arrepelam-me as saudades mas volto sempre... Tanto turbilhão nestes vôos alargados que a memória vai consentindo...Depois tudo tem cheiro cor música ritmo alegria tristeza ansiedade partida regresso...Um vaivem infernal do pensamento deambulante até às tantas da madrugada! Que bom é viajar e ninguém dar por estas minhas ausências. Vou e venho quando quero e sempre que me apetece. Não tenham dúvidas. Sermos donas de nós próprias e sabermos navegar orientando bússolas sermos timoneiros do nosso destino no mar na terra no ar assim olhando flores animais peixes pombas corvos borboletas cigarras em festa os paraísos secretos e tudo libertado e eu vestindo leve saltando leve voando leve cantando sempre a vida breve que foi tão longa verdadeira num sonambulismo adivinhada...Só não consigo a vibração nas coisas retratadas. Essa a grande luta e a gritante frustração!. O resto é perfeito.Vejo tudo e todos com uma enorme e inesgotável clareza! Demoro o tempo todo que no apetite cabe. Os sentidos abrem-se em leque e quase sinto oiço vejo toco cheiro neste perder países viajando! . E, quanto mais longe me ausento, mais o retrato de tudo é mais perfeito. As acácias em flor o cheiro do caril a forte maresia do Índico o aveludado da paisagem e tudo a perpassar nas coisas de leve quase sussurrando... o zumbir do mosquito o cantar do simba o arrastar do leopardo velho o crocitar do corvo o gargalhar da Kizomba o riso cristalino das crianças o parque dos baloiços as rodas as corridas as cantigas as vozes ai as vozes na voz a chamar...Regresso doloroso. Aceno mais uma vez. A minha liberdade! Esta a minha liberdade amarrada à escrita de onde tudo sai... O grito os olhos rasos de água a garganta apertada o peito dolorido a mágoa a cabeça vazia a memória acordada... Chego ao ponto de partida. O navio larga as amarras a sirene vibra no espaço o último aceno o marulhar das ondas o mar o céu o dia o Sol a noite as estrelas a lua...Ó meu Deus! Esqueci-me que era hoje o dia da partida. Dia 24 de Agosto de 1957, rumo a África / Moçambique.
Ficarei à espera no cais... "quando se fez ao largo a nau na noite escura/ na praia aquela mulher ficou chorando..."
sexta-feira, 2 de abril de 2010
no chão
sexta-feira, 26 de março de 2010
quinta-feira, 25 de março de 2010
segunda-feira, 25 de janeiro de 2010
sábado, 28 de novembro de 2009
" SE AQUILO QUE A GENTE SENTE..." Disse, Augusto Gil, numa das suas "Quadras Soltas" esta sentida quadra que decorei há tantos anos que se perde no tempo, mas sem na altura ligar muito à profunda exteriorização do poeta. Só hoje, eu sinto essas palavras que se aconchegam cada vez mais na minha memória num conforto para a alma. E que penso, são quase donas da minha invenção. "Se aquilo que a gente sente/ cá dentro tivesse voz /toda a gente muita gente/ teria pena de nós."
Como os anos passam. Como tudo acontece tão de repente...Que pena de não ter agarrado a vida nos bons momentos que pensava eternizarem-se. O ontem tão distante do hoje mas, curiosamente, ligados pelos fios ténues da recordação, embora fortemente marcados na memória que o tempo não apaga. Mas tudo se esfuma como nuvem que passa...Se a vida é ai que mal soa. Sei que não chorei o que devia. Ou chorei tudo dentro de mim? Talvez não aos olhos de toda a gente. A dor carrega-se no silêncio e com o silêncio. "Se aquilo que a gente sente/Cá dentro tivesse voz..." Mas, também a solidão das noites nos compensa de alguma forma, sobretudo quando nos faz emigrar para as recordações que são passado feliz e que se anseia recordar sempre. É, ironicamente, um pouco do remédio que nos resta! Ou será este, outro flagelo que cruelmente nos surpreende? ...Longe, muito longe, está bem viva nos mosaicos da memória, toda a minha vida passada.Vida resplandescente, saudável, passeada nos jardins da minha juventude. E era assim coroada de uma suprema ingenuidade que o aconchego da família sustentava tão serenamente, nesse bom viver e nessa forma de estar. Nada me faltava e nada me faltou. Sempre. Mais tarde, o Amor, a dedicação, os cuidados redobrados, que a vida reserva nessa partilha a dois e que muitas vezes, o destino das surpresas, nos reserva. E, tudo aconteceu, tão de repente, nessa noite de verão. Foi no dia 24 de Agosto, em Alpedrinha. Era uma estância muito agradável e onde se juntava muita gente, vinda de todas as partes do país, para ali gozar as melhores e mais tranquilas férias na paz bendita da Serra. Esta, coberta da sua giesta em flor, parecia emoldurar-se nos nossos olhos como cenário único! Tal o seu encanto. E, era o dia e a noite que nos trazia os amigos a confraternização e os novos conhecimentos. Eram as noites mágicas dos passeios, dos bailes e dos encontros. Tudo era naturalmente belo como a paisagem que evidenciava a beleza da nossa juventude. A nossa liberdade, o nosso êxtase pela vida. Inanarrável a esta distãncia! E, como sempre, acontecendo as melhores e grandes surpresas. Foi numa noite de verão escaldante. O céu engrandecia-se com o brilho vivo de tantas estrelas. Era noite de baile. Por essa altura, iniciava-se o cortejo da entrada com alguma gala e circunstância. E, era gente grada de todas as redondezas que ali afluía. Do Fundão, da Covilhã, de Castelo Branco, entre outras. A realização de um baile circunstancial no final de Agosto era já uma tradição. Tinha lugar no Clube da simpática vila beirã. Eu, com os meus pais e irmãos, gozava naquela estância, já de tradição, os belos ares da Serra da Gardunha que acalmavam a vida agitada, passada um mês antes, na praia da Nazaré com toda a inquietude que as férias, nestas estâncias, proporcionam. ...Tocava uma valsa. O meu irmão mais velho, quis iniciar o baile comigo. As pessoas à volta olhavam-nos com admiração. Era jovem e bonita, o meu irmão jovem e garboso cadete da Escola do Exército. Outros pares se estrearam mas nós sempre na berlinda das atenções. E, foi nessa noite, que a minha vida iria ter outro rumo. A música não cessava de animar o ambiente, ora bem ritmada ora mais lenta, na volúpia dos pares apaixonados. Quanto a mim, embora com muitos pretendentes, confesso que não me tinha decidido verdadeiramente por nenhum. E, já tinha pares para quase toda a noite. Havia, naquela altura, a oportunidade de marcarmos as danças com os rapazes, o que chegasse em primeiro lugar tinha a primazia e por aí fora.E, eu lá disparava com alguma galanteria, sempre que pretendida, as frases para entreter...só para a 5ª música! A determinada altura da noite, chegam algumas famílias da cidade da Covilhã e da então, vila do Fundão que ali gozavam as suas férias. Aconteceu, que uma amiga, hoje minha cunhada, vem ter comigo para me comunicar que havia alguém no salão, ansioso por me ser apresentado. Primeiro, não liguei, mas pela insistência, tornei-me curiosa. E, eis-me à sua frente . Os nomes, os cumprimentos, um furtivo olhar, e o meu destino ali a ser traçado sem quase dar conta. Pouco tempo passou e já não me lembrava do seu nome. Ele, António Paulo, não se esqueceu do meu. E, chegando de novo junto de mim, pediu-me para dançar. Respondi-lhe que não, porque estava já comprometida para aquele momento e para o outro ...e outro... O quê? respondeu. Tenha paciência mas não pode ser como diz... Isso é muito tempo de espera e eu quero dançar já consigo. Portanto, descomprometa-se e mais ainda, vai ser o meu par para o resto da noite. Dizendo isto, com um sorriso que me conquistou. Mas a minha primeira impressão foi de surpresa. Eu, que comandava tudo a meu bel-prazer e sabia estar ou não estar com quem me agradava apenas, e a receber ordens! Confesso que passei da surpresa da graça autoritária ao consentimento. E, o que é certo é que acedi pela forma original do seu convite. O meu destino, feito dos meus sonhos burilados de encanto e de esperanças, estava traçado. Era médico na capital. Namoro breve de um ano, acentuado por imensas saudades, pelo facto de ter estado quatro longos meses no estrangeiro. Casámos um ano depois. Relembro que na altura em que estava para chegar a Lisboa, tínhamos ensaiado o nosso reencontro, através de uma correspondência quase diária, cheia de projectos e de grandes sonhos de amor. Dizia-me na sua escrita apaixonada que ao desembarcar, me afogaria com muitos beijos. Mas, na altura estava acompanhada da minha mãe, que juntamente com o seu pai, figura grada da Magistratura, na capital, o esperava também. Eu, uma romântica por excelência, já me via a correr para ele mal o avistasse. De facto, corremos um para o outro mas, ali ficámos extasiados com os olhos brilhantes de desejos incontidos para adoçarmos aquela separação!E foi apenas um beijo pueril que fez jus àquele momento. A liberdade do gesto e da acção retesada pelos valores fundamentais de então... Mas respeitavam-se. E, foi assim que a nossa vida se iniciou, estruturada num amor verdadeiro e para todo o sempre. Até ontem... Que felizes fomos! Eu era muito mimada e continuava a sonhar. O meu marido tinha mais uns anos do que eu mas tão jovem de espírito e de compreensão que sempre me encantou. Fazíamos um belo par. Tinha muito orgulho nele. Um pedaço de céu que me cabia. Dois anos passaram. Entretanto, o meu marido entusiasmado por colegas do então, Hospital do Ultramar, onde trabalhava e com alguns a pensar África, resolveu-se também a experimentar essa aventura. Os médicos eram mal pagos. Estávamos em começo de vida. E, depressa se deu resolução a esse novo percurso. Chorei como uma madalena por ter de deixar os meus pais e irmãos. Era e continuo a ser muito ligada à família, infelizmente agora mais reduzida. Partimos rumo a Moçambique. O nosso destino por um período de 17 anos! Recordo ainda a despedida. Tão presente estava. Apesar dos 19 dias de viagem a bordo. A sirene do navio, as serpentinas, ténues ligações a rasgarem-se no primeiro deslizar do navio e a música envolvente...Senti o coração apertado pelos acenos que ficaram no cais a transformarem-se cada vez mais em pontinhos brancos na distância. Até desaparecerem no horizonte. A viagem entre o mar e o céu tinha o condão de nos embalar e de fixarmos os olhos nessa fusão de azul infinito e das grandes causas. E dos grandes mistérios. E o amor superou tudo e todos. Muito embora ficassem as saudades. Connosco viajava o nosso primeiro filho, o Zé de um ano apenas. Percorremos Moçambique de Norte a Sul e lá vivemos e demos 17 anos das nossas vidas. Regressámos em 1974 a Portugal. Pelos motivos conhecidos. Recomeço de nova vida e a luta iniciou-se com toda a coragem e determinação. Como a que vivemos em África. Somente o clima o espaço e as pessoas eram diferentes. A solidariedade em terras do Índico era única! O António voltou ao seu trabalho no Hospital Egas Moniz e Centros de Saude, eu, a regressar à Faculdade para terminar o Curso de Românicas já iniciado, e a leccionar no Ensino Secundário concorrendo em mini-concursos. Fazia-me então companhia o meu filho mais velho que por essa altura entrava para a Faculdade de Direito. E foi uma nova luta que cada um se encarregou de levar a bom termo. Todos os outros três a acabar o Secundário e a continuar depois no Ensino Superior. Foi toda a nossa vida uma vida cheia de tudo. De bons e maus momentos. Preenchida de alegrias e de tristezas. De grandes preocupações e de momentos cheios de sol e de paz duradoura.Como todas as vidas. Afinal o percurso é sempre igual para todos, variando as nuances que experimentamos ou que a vida nos reserva enquanto por cá se caminha. Depois, a rotina dos dias transformados em meses, anos, sempre chegando ao sábado num fechar de olhos, e às épocas festivas, num suspiro, por aqueles que vão ficando no meio do caminho...E rolam os anos e rolam as vidas e tudo se precipita no caos da existência. Que dá para pensar quando chegamos ao outono da vida. E nos encontramos cada vez mais sós...Que lágrimas sustenta agora esta tão profunda e eterna saudade! A concentração de um tempo único feito de risos e de lágrimas. Para sempre relembrado.
domingo, 15 de novembro de 2009
Minhas noites africanas
No negrume
Denso agreste
Lembrar-vos
Causa arrepio
De quem vos sentiu
Tão perto
África
Mistério aventura
Foste paz
No meu deserto
Na noite de tantos anos
Na noite de tantos ais
As vozes vêm chegando
Da selva inteira crispada
Ruídos silvos estranhos
Vultos que se movem sem ver
Numa feroz gargalhada
Corujas simbas quizumbas
São gritos qu’inda transporto
Como orquestra na memória
E quando o dia raiava
Em grandes bandos os corvos
Atacando o cajueiro
Debicando e sugando
O líquido que os saciava
Sem terem outra razão
Caíam tontos no chão
E eram luto nos meus olhos
Tudo temia e enfrentava
Na coragem dos teus sóis
Brilhando nos milheirais
E quando a terra abafava
E tudo à volta fervia
A tromba de água caía
Açoitando os areais
Da tua terra molhada
O cheiro que se bebia
Era néctar o perfume
Colhido do incenso agreste...
E tudo mais se esquecia
Do mundo nada sabia
Saudade do teu saber
Saudade não sei dizer
De tudo quanto nos davas
De tudo quanto nos deste
Minhas noites africanas
Quantos segredos e medos
Quanta ventura e esperança
Quanta angústia e tanta espera
Quanta vida e tanto ardor...
A ti voltaria um dia
Pela mão do meu amor!
quarta-feira, 7 de outubro de 2009
PARA SEMPRE É MUITO TEMPO...
a ti meu querido irmão gémeo, João Filipe)
Hoje, dia 30 de Outubro, fazemos anos. Ou, fazíamos.
Sem ti, o nosso aniversário, fica na metade... Sem sentido. Sem concerto. Sem festejo.
Agora, já sem tempo para o tempo deste dia. E tudo vai tão longe e se eterniza! Mas eu recuso a tua ausência. Continuas comigo e com aqueles que tanto te amavam! Enquanto gémeos, só agora sinto que foi cortado, definitivamente, o cordão umbilical...A morte na sua forma mais natural e mais cruel, abateu-se entre nós . Tu partiste e eu fiquei. A sentir mais um vazio que medir não posso, e que mergulha cada vez mais fundo, na derradeira vontade, da minha solidão.
tivesse alguma vez
e em vão sonhado
que tua voz, doce canto
cessaria
como no outono
o vento louco, crispado
envolvesse de neblina
a nossa vida
como a nuvem do céu
o alegre prado
tivesse alguma vez
a dor certeza
de toda a incerteza
descansa em paz
meu querido irmão
na Paz que tens...
e não te tendo perto
hoje, a meu lado,
jamais eu quero em mim,
os parabens...
Bé
Isabel Ribeiro Monteiro
Lisboa,30-10-2009quinta-feira, 24 de setembro de 2009
segunda-feira, 14 de setembro de 2009
sexta-feira, 28 de agosto de 2009
ÁFRICA MINHA
Mocímboa da Praia-Cabo Delgado,1957/58
Está o simba a cantar
lá no rio Quinhevo
enchiam-se os ares
de tantos horrores
e os horrores de medo
onde canta o simba?
lá no rio Quinhevo
e o preto estendia
o braço comprido
só se via o dedo
apontar distância
que não se media
e o simba cantava...
o banzé terrível
no silêncio enorme
era só quebrado
p´lo cantar do simba
lá no rio Quinhevo
e o simba cantava...
só o rio se riu
e guardou o medo
do simba a cantar
lá no rio Quinhevo (O rio Quinhevo fica a 5Km de Mocímboa da Praia!Mas ouvia-se o cantar leão)
quinta-feira, 27 de agosto de 2009
segunda-feira, 10 de agosto de 2009
África minha (1957/1974)
Foi talvez em África, espaço de infinitos e matizados horizontes e que a memória não esquece, que vivi os 17 anos mais celebrados e felizes da minha (nossa) vida. E, tudo me faz voltar a essas recordações que se foram, conjungando-as com o nascer dos nossos filhos. Meu marido foi médico em África. Com ele, percorremos os espaços exóticos que vão desde os distritos de Cabo Delgado , passando pelo do Niassa, Zambézia, Sul do Save até à fixação dos últimos quatro anos na cidade de Nampula. De tudo o que aí me deixou presa, registo, numa breve e sentida alusão, já gravada e escrita no meu livro, África nos Socalcos da Memória, 1998, que é quase um grito um hino uma saudação à ÁFRICA desse nosso/vosso tempo
...Distância marcada pelos horizontes sem fim mistura de selva e deserto de coloridos e sons múltiplos que a Natureza oferece naturalmente como orquestra implantada no seu seio com todos os sustenidos e bemóis a compor os ritmos das suas melodias e ritmos
Dos tantãs a comunicar na distãncia ao toque dos marimbeiros a fazer requebrar de forma única o seu corpo inteiro
África da nudez natural da cor morena estonteante! África a erguer-se nas manhãs claras para adormecer na languidez da noite no seu corpo cansado
África dos mistérios nocturnos das caçadas do coração a bater no emaranhado da selva escura na tentação de desvendar os seus íntimos segredos
África das Impalas amedrontadas e do olhar fascinante do leão dominador
Das pegadas gigantescas do elefante a pôr em debandada os grandes sonhadores das aventuras ímpares...
África minha risonha dos dias quentes que se eternizavam e que bebiam na noite a beleza inefável de uma Lua verdadeira já que no hemisfério Sul
África saudade das chegadas e partidas das viagens no teu seio a albergar os filhos de todos nós
África suor no rosto por tudo o que foi erguido. Na tua seiva bruta a nossa elaborada
África dos medos e dos receios vencidos
África fraterna nesse caminhar de mãos dadas
Que é de tantos anos?
Que é das noites de solidão e dos risos de todas as manhãs?
África minha e de todos vós
África a caber no coração de Portugal
África...
Onde estás agora?!
sexta-feira, 7 de agosto de 2009
quinta-feira, 6 de agosto de 2009
Lá vem a negra
Lá vem a negra
Gingando
Ancas largas
cintura fina
De peito roliço
Rolando...rolando...
O seu corpo é rio
Seus gestos
São música
Mas também vem triste
Que feitiço existe?
Rolando no chão
Já ninguém a quer
Vai tirar feitiço
Ali na palhota
Seu mestre entendido
Espera por si
Abre-se uma porta
Horas invulgares
Que não são de espera...
Negra agora vem
Toda transparente
A trouxa de roupa
Debaixo do braço
Nos olhos a fala
Do vermelho ardente
Seu corpo de fogo
Na nudez do vento
Suas coxas grossas
Dobradas no riso
Toda sensual
Traça a capulana
De cor encarnada
Descalça dançando
Gingando gingando
Molha-se no rio
Estende-se nos verdes
Os verdes se agitam
São todos bandeiras
O sol é ardente
Na sombra esquecida
Se acendem desejos
E o que Deus quiser
E foi nesse grito
Que nasceu o mito
D´Africa Mulher.
Mas é moda já se vê...
Solicita-se uma foto adequada...
Mas é moda já se vê
A aparente juventude
Que o bisturi atesta
Não só a aparência ilude
Parecem múmias em festa
Do lugar tão contrafeito
Parecem até querer voar
Quais pombas do parapeito
Quanto aos lábios tão carnudos
Que tantas lutam a ter
Torna o semblante sisudo
Fica o sorriso a haver
Desfiguradas lá vão
Até à meta final
E nem pensam como são
As máscaras do Carnaval
Em tudo o que não se crê
Mas é moda já se vê…
Isabel Monteiro
19-09-2008