sexta-feira, 28 de agosto de 2009




ÁFRICA MINHA
Mocímboa da Praia-Cabo Delgado,1957/58


Está o simba a cantar
lá no rio Quinhevo
enchiam-se os ares
de tantos horrores
e os horrores de medo


onde canta o simba?


lá no rio Quinhevo


e o preto estendia
o braço comprido
só se via o dedo
apontar distância
que não se media


e o simba cantava...


o banzé terrível
no silêncio enorme
era só quebrado
p´lo cantar do simba
lá no rio Quinhevo


e o simba cantava...


só o rio se riu
e guardou o medo
do simba a cantar

lá no rio Quinhevo (O rio Quinhevo fica a 5Km de Mocímboa da Praia!Mas ouvia-se o cantar leão)

quinta-feira, 27 de agosto de 2009

Percorri Moçambique de norte a sul condicionada à vida profissional do meu marido, médico, do então Quadro Comum do Ultramar. Com ele, percorri um mundo totalmente diferente, de espaços inóspitos mas estranhamente belos e que não cansavam o nosso olhar perscrutador. As picadas, eram as estradas nesse norte de Moçambique, onde pululava toda a fauna selvagem que nos saltava ao caminho e também as estranhas gentes, nomeadamente, os macondes, que se exibiam com tatuagens várias sobretudo no rosto, deixando ver também uns dentes serrados, e que nos olhavam com perplexidade, mas que uma saudação amigável da nossa parte, lhes dava confiança, correspondendo então, com acenos vários. Elas, apenas usavam a capulana à cintura, exibindo algumas, os peitos muito caídos que os filhos puxavam e chupavam até tarde. Eles, apenas colocavam uma tanga, qual folha de parreira, exibindo todo o corpo de pele áspera e com crateras visíveis pelo sol ardente de África. Um verdadeiro paraíso selvagem.Falo do distrito de Cabo Delgado, nas regiões de Mueda e de Palma que visitava todas as semanas, acompanhando meu marido nas suas visitas Sanitárias e às Maternidades.Distanciavam estas povoações, respectivamente, 80Km de Mocímboa da Praia, que foi a terra do nosso baptismo, em Moçambique. E começaram aí também as nossas estranhas aventuras das arábias...Tanto colorido tanto cheiro quanto mistério e beleza a fixar no olhar ávido de curiosidade, nessa distância que parecia não ter fim.

segunda-feira, 10 de agosto de 2009

África minha (1957/1974)


Foi talvez em África, espaço de infinitos e matizados horizontes e que a memória não esquece, que vivi os 17 anos mais celebrados e felizes da minha (nossa) vida. E, tudo me faz voltar a essas recordações que se foram, conjungando-as com o nascer dos nossos filhos. Meu marido foi médico em África. Com ele, percorremos os espaços exóticos que vão desde os distritos de Cabo Delgado , passando pelo do Niassa, Zambézia, Sul do Save até à fixação dos últimos quatro anos na cidade de Nampula. De tudo o que aí me deixou presa, registo, numa breve e sentida alusão, já gravada e escrita no meu livro, África nos Socalcos da Memória, 1998, que é quase um grito um hino uma saudação à ÁFRICA desse nosso/vosso tempo

...Distância marcada pelos horizontes sem fim mistura de selva e deserto de coloridos e sons múltiplos que a Natureza oferece naturalmente como orquestra implantada no seu seio com todos os sustenidos e bemóis a compor os ritmos das suas melodias e ritmos
Dos tantãs a comunicar na distãncia ao toque dos marimbeiros a fazer requebrar de forma única o seu corpo inteiro
África da nudez natural da cor morena estonteante! África a erguer-se nas manhãs claras para adormecer na languidez da noite no seu corpo cansado
África dos mistérios nocturnos das caçadas do coração a bater no emaranhado da selva escura na tentação de desvendar os seus íntimos segredos
África das Impalas amedrontadas e do olhar fascinante do leão dominador
Das pegadas gigantescas do elefante a pôr em debandada os grandes sonhadores das aventuras ímpares...
África minha risonha dos dias quentes que se eternizavam e que bebiam na noite a beleza inefável de uma Lua verdadeira já que no hemisfério Sul
África saudade das chegadas e partidas das viagens no teu seio a albergar os filhos de todos nós
África suor no rosto por tudo o que foi erguido. Na tua seiva bruta a nossa elaborada
África dos medos e dos receios vencidos
África fraterna nesse caminhar de mãos dadas
Que é de tantos anos?
Que é das noites de solidão e dos risos de todas as manhãs?
África minha e de todos vós
África a caber no coração de Portugal
África...
Onde estás agora?!

sexta-feira, 7 de agosto de 2009

quinta-feira, 6 de agosto de 2009

E Nada Acontece



Poema de Isabel Ribeiro Monteiro

Arranjo e declamação de Filipe Monteiro

Lá vem a negra




Lá vem a negra
Gingando
Ancas largas

cintura fina
De peito roliço
Rolando...rolando...

O seu corpo é rio
Seus gestos
São música
Mas também vem triste
Que feitiço existe?

Rolando no chão
Já ninguém a quer
Vai tirar feitiço
Ali na palhota
Seu mestre entendido
Espera por si
Abre-se uma porta
Horas invulgares
Que não são de espera...
Negra agora vem
Toda transparente
A trouxa de roupa
Debaixo do braço
Nos olhos a fala
Do vermelho ardente
Seu corpo de fogo
Na nudez do vento
Suas coxas grossas
Dobradas no riso
Toda sensual
Traça a capulana
De cor encarnada
Descalça dançando
Gingando gingando
Molha-se no rio
Estende-se nos verdes
Os verdes se agitam
São todos bandeiras
O sol é ardente
Na sombra esquecida
Se acendem desejos
E o que Deus quiser

E foi nesse grito
Que nasceu o mito
D´Africa Mulher.

Mas é moda já se vê...



Solicita-se uma foto adequada...


Em tudo o que se não crê…
Mas é moda já se vê

A aparente juventude
Que o bisturi atesta
Não só a aparência ilude
Parecem múmias em festa


São os peitos a saltar
Do lugar tão contrafeito
Parecem até querer voar
Quais pombas do parapeito

Quanto aos lábios tão carnudos
Que tantas lutam a ter
Torna o semblante sisudo
Fica o sorriso a haver



Desfiguradas lá vão
Até à meta final
E nem pensam como são
As máscaras do Carnaval

Em tudo o que não se crê
Mas é moda já se vê…

Isabel Monteiro
19-09-2008